As paródias de músicas em jingles políticos sem autorização dos compositores originais estão proibidas nas eleições 2024. A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já era esperada pelos autores e, além de incluir o tema das paródias, aborda o problema da crescente difusão dos deepfakes, montagens digitais com enorme nível de verossimilhança que podem simular declarações falsas atribuídas a personagens públicos ou até apoios inexistentes a determinados candidatos. Em ambos os casos, o dano moral aos envolvidos sem sua autorização seria o mesmo, ao ter sua imagem associada a figuras do mundo político com as quais poderiam inclusive estar em completo desacordo ideológico.
‘As campanhas políticas e todo esse pessoal de partido político têm que entender que não pode usar, porque eles pegam a música mais executada do momento e faz em cima daquela melodia e daquela harmonia a letra do candidato. Eu não consigo entender que seja uma paródia, porque a paródia é aquele humor que o Chico Anísio fazia, então ele é um humorista, ou Renato Piaba, ali é um parodista. Agora, um político que usa uma harmonia, uma melodia, faz uma letra, ainda que ela seja bem humorada, não é a paródia, não é o significado do jocoso, do alegre, do divertido que a gente tem na lei’, analisa a advogada especialista em Direito Autoral, Dra. Jaqueline San Galo, em entrevista ao Bom Dia Feira.
A advogada destaca que a lei brasileira dos Direitos Autorais é protetiva, baseada na convenção de Berna, que tem parâmetros mínimos de defesa do recebimento financeiro por parte do autor.
‘Toda obra quando é utilizada, tem que sempre pensar nesse parâmetro, que é o princípio para garantir que isso se sustente. Como é que toda a cadeia produtiva que vai trabalhar na campanha, o publicitário vai ganhar, o videomaker vai ganhar, o radialista vai ganhar, o apresentador vai ganhar, mas o compositor não vai ganhar porque é uma paródia? não é paródia, primeiro ponto. Segundo ponto, ele tem que autorizar. Se eu peguei aqui a sua campanha na televisão ou no rádio, mando para o TSE, através dos TREs, ele vai lhe notificar e você tem um prazo de dois dias para apresentar a notificação, a comunicação, a liberação, autorização que eu lhe liberei de graça ou que você me pagou, então quem tem que provar agora que foi autorizado é o candidato ou o partido que tem utilizado, e dois dias é o prazo. Com a reincidência, vai ter uma multa maior, então você não obedeceu, você desobedeceu a ordem judicial, você vai ter uma desobediência civil, que você não pode se recusar. A coisa certa disso é pedir autorização’, explica San Galo.
A grande visibilidade que o assunto ganhou começou em 2014, quando, numa de suas campanhas para deputado federal, o palhaço Tiririca fez uma “paródia” da canção “O Portão”, de Erasmo e Roberto Carlos. Na ocasião, os versos “Eu voltei, agora pra ficar/Porque aqui, aqui é meu lugar” foram alterados pelo palhaço para “Eu votei, de novo vou votar/Tiririca, Brasília é meu lugar.”
Após uma longa batalha judicial entre Tiririca e a Sony Publishing, editora da obra original, o STJ liberou as paródias, em 2022, amparando-se num argumento amplamente criticado por juristas: o de que elas se inserem no contexto da Lei de Direitos Autorais (9.610/98). Em tal normativa, porém, a finalidade das imitações, piadas e paródias é preservar a liberdade de expressão e as manifestações artísticas críticas e/ou cômicas, que tenham um fim em si mesmas, e não o propósito de vender e oferecer serviços, produtos ou, no caso, promover candidaturas. Atualmente, quem analisa o caso dentro do STJ é o ministro João Otávio de Noronha, e não há um prazo pré-definido para a sua conclusão.
Confira a entrevista na íntegra: