Cotidiano das Feiras livre: condição de higienização prejudica saúde de mulheres feirantes

Terceira de uma série de matérias sobre realização do projeto "Práticas de cuidado no cotidiano de feirantes de Feira de Santana" desenvolvido com alunos dos cursos da área de saúde da UEFS - ações e estratégias são traçadas para conscientização

Joaquim Neto

A estudante de enfermagem da Universidade Estadual de Feira de Santana, Allena Costa, do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre o Cuidar/Cuidado (NUPEC) realizou pesquisa sobre as condições de trabalho e concepções sobre saúde e doença nas narrativas de mulheres feirantes do bairro Tomba. "A nossa ideia era saber quais eram as condições de trabalho que essas mulheres estavam inseridas e, a partir disso, saber o que elas pensavam sobre saúde e doença, sempre correlacionando a condição de trabalho sobre como ele iria influenciar em um processo de adoecimento", contou.

Participaram da pesquisa 06 mulheres na faixa etária de 26 a 65 anos - uma média de 30 anos, que se concentram nas proximidades do coreto e anexos da feira do Tomba, vendendo mercadorias diversas. "Primeiro a gente fez uma feira de saúde para criar um vínculo com essas mulheres e posteriormente eu fui com um termo para convidá-las a participar, explicando sobre a pesquisa e deixando explícito seus direitos, uma vez que ainda que aceitem podem desistir de participar a qualquer momento e a gente tem que deixar isso claro", explicou sobre a captação. 

A estudante acredita que a relação previamente estabelecida com a criação de vínculos é importante para a adesão das entrevistadas. "A feira é dinâmica, então o fluxo de fregueses não para e ela precisa dar atenção a essas pessoas porque são o fruto do sustento das famílias delas, então se eu chegar propondo uma entrevista elas não vão parar para me atender porque irão preferir vender. A gente fez uma feira de saúde itinerante antes, onde foram realizadas atividades de promoção a saúde como aferição de pressão arterial, questão de vacinação e atividades lúdicas que permitiram explicar o retorno para fazer a pesquisa, de forma que quando voltei, já tinha captado os pontos de referência de  onde cada uma que aceitou previamente participar da pesquisa se localizava e muitas delas me reconheceram, assim não enfrentei nenhuma situação de recusa e tudo aconteceu tranquilamente como em um bate-papo", relatou. 

Os problemas de maior incidência em relação às condições de trabalho foram iluminação, ventilação, organização e principalmente higienização na feira. "Eu perguntava a cerca e elas me davam opinião, então quando a gente vai ordenar essas trajetórias, as mulheres teciam opiniões negativas em relação a esses pontos e isso identifica que existe alguma coisa acontecendo na feira por conta, especialmente da higienização", considera. "Muitas falaram que ficavam, por exemplo, com infecção urinária porque o banheiro era muito sujo e elas tinha a consciência de não culpabilizavam os prestadores de serviço da prefeitura que ia lá limpar, mas responsabilizavam as pessoas que não mantinham", aponta.

A estudante de enfermagem ressalta a importância da higienização para pessoas que trabalham com o manuseio de comida, mas nos depoimentos ficava claro que as mulheres têm esta preocupação, inclusive para que o freguês se sinta mais confortável, porém, ainda enfretam dificuldade na mudança da realidade que necessidta de cooperação coletiva dos frequentadores do ambiente. 

Vários trabalhos são desenvolvidos concomitantemente pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre o Cuidar/Cuidado (NUPEC) e, segundo Allena, se conectam para que os resultados retornam para a comunidade como promoção e prevenção à saúde. "Sempre quando a gente tem alguma pesquisa, não fazemos sozinhos. A feira intinerante, por exemplo, foi feita em coletivo, então para a devolutiva dos resultados destas pesquisas para a comunidade a gente pensa em fazer novamente uma feira de promoção e prevenção à saúde na qual a gente vai levar cartilhas obrigatórias com os dados, além de palestras de boas práticas e higienização e cuidado tanto para mulheres quanto para homens", declarou. 

Allena Costa acredita que, com os resultados alcançados, é possível que haja uma mudança na realidade vivenciada nos ambientes. "Nas próprias narrativas as mulheres trazem que a feira é um ambiente que elas têm uma certa gratidão, sabem que aquilo ali provê o sustento da família e têm um compromisso, sabem da responsabilidade e não é algo que estão fazendo apenas por obrigação - ah, eu tenho que ir trabalhar, não não gosto desse trabalho. Elas relatam que e como se a feira fosse um lazer, um hobbie, um lugar que elas estão felizes em trabalhar para não ficar no ócio. Percebem que a feira é um lugar importante e, quando a gente começa a conversar - porque a entrevista não é quadrada e funciona como um bate-papo, a gente pode falar coisas sobre promoção à saúde que essa mulher vai internalizando e aprendendo. Ela aprende e eu aprendo também, é uma troca!", considera.

A estudante é bolsista e faz pesquisa há 4 anos e há 3 anos trabalha com feirantes, sempre com grupos de mulheres pelo interesse na saúde feminina. "No primeiro ano trabalhei com o processo de como se dava a harmonização da rotina das mães feirantes para cuidar de seus filhos - itinerários terapêuticos das mães feirantes no processo de cuidar de seus filhos. A gente percebeu nos resultados que a mulher é a principal cuidadora da família e tinha uma rede de apoio formada também por mulheres de forma que a figura masculina aparecia muito discretamente", resumiu.

No segundo ano, concluiu acerca das condições de trabalho das feirantes e agora Allena busca acerca do protagonismo das mulheres no cuidar de si e da família porque na pesquisa de mães feirantes ficou evidenciado que a mulher é a principal cuidadora da família, mas resta a dúvida de como essa mulher cuida de si. " Será que com essa dupla jornada que a gente já sabe que ela enfrenta consegue cuidar de si? Ela protagoniza o cuidado ou precisa de ajuda de outras pessoas? Ou ela não cuida de si para cuidar só da família?! Essa pesquisa a gente está encaminhando para ir a campo na feira livre da estação e Cidade Nova", depôs sobre o futuro de suas atividades.

Informações de Joaquim Neto

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