Autor Daniel Pintto considera que a identidade negra deve ser refletida em todos os meses

O professor e autor lança livro em que faz reflexões a cerca da superação de atos de racismo

La�s Sousa

O mês de novembro é considerado pelo professor geógrafo especialista em antropologia e turismo, Daniel Pintto, como extremamente importante pela representatividade Zumbi, diferente do mês de maio, que foi, durante muitos anos, institucionalizado como o mês de referência devido ao acontecimento da abolição da escravatura. “O novembro negro está direcionado ao homem negro que fez um diferencial para o próprio povo negro dentro de uma esfera mais ampla, ainda que existam relativas controvérsias. As discussões nesse mês são fortes, importantes e necessárias, mas a negritude deve ser questionada de janeiro a janeiro, independente do horário, local, formação profissional ou instituição porque todos nós estamos em todos os lugares e não existe especificamente um mês para que a gente venha dar uma validação a importância de todas as pessoas”, acredita.

O autor de Reflexões Negras - Superando o racismo e seguindo em frente pontua que, embora em novembro haja um direcionado para as discussões sobre a população negra, isso deve ser colocado em pauta durante todos os anos. “Parece que o Brasil pára para discutir a população negra e conscientizar, mas o que seria essa conscientização em somente um mês se durante os onze outros meses do ano a gente vê atrocidades cometidas, não por uma questão de caráter, mas somente pelo fato de uma pessoa ser negra. Eu acho que essas discussões podem ser pontuais durante todo o ano para que tenhamos um futuro menos racista e segregatório”, defende.

O professor Daniel declara que deseja que o conteúdo discutido em seu livro esteja obsoleto daqui há algum tempo pelo avanço da sociedade. “Eu gostaria muito que alguém chegasse, daqui há 10 anos, e me dissesse que este livro está obsoleto. Eu quero acreditar nessa possibilidade de que alguém me diga isso, levando em consideração que em 2028 essas questões não sejam mais necessárias, justamente por ter uma sociedade mais equilibrada no que se refere a direitos e deveres para brancos, negros e todos os outros povos”, anseia.

O autor acredita que exista uma “luz no fim do túnel” principalmente levando em consideração que essas discussões não existiam com tanta dinamicidade e propriedades há cerca de 15 anos atrás. “Hoje nós conseguimos encontrar pessoas negras em alguns espaços que eram negados, mas ainda com essa presença há um incomodo próprio para os racistas que não aceitam e não querem que todas as pessoas possam ser vistas dentro de uma situação de igualdade. Então é um desejo, uma possibilidade, mas também é necessário ampliar esse espaço não somente no mês de novembro, é necessário que esses espaços, em todas as esferas, sejam realmente garantidos, para que a criança de hoje possa se espelhar, ter referenciais e identidade organizada sem se sentir menosprezada por uma falsa brincadeira ou por uma estratégia de omissão de existência do povo negro”, aponta.

Reflexos

Quanto às políticas públicas e sistemas implantados no Brasil, como as cotas, Daniel Pintto aponta que atualmente sofremos reflexos de benefícios que existiam entre os séculos XVIII e XIX. “Quando se fala em políticas públicas e sistemas existentes é necessário que não tenhamos um olhar imediatista porque, já houve um sistema de cotas, no passado, para euro descendente, comprovado até a segunda ou terceira geração anterior, que dava benefícios sociais diretos. Isso vai refletir agora, em pleno século XXI e, quando se fala em sistema de cotas, há uma política muito estrategicamente organizada para tentar destruir essa possibilidade de inclusão do negro através de um sistema que já foi utilizado por não negros”, observa o professor ao apontar a necessidade conhecimento mais amplo da população a respeito dessa realidade.

“É algo inclusivo, não uma estratégia de inclusão querendo mostrar que o negro tem menos capacidade ou não, muito pelo contrário, teoricamente as possibilidades são as mesmas, mas na prática isso é muito diferente quando a gente vê pessoas negras que não estão inseridas no contexto socioeconômico direcionado para fazer a mudança do Brasil”, aponta. “A gente vê o quanto é necessário uma série de ações para que todos possam ser incluídos. Não haverá uma inclusão de um para exclusão de outros, há espaço para que todas as pessoas, dignamente, através de conhecimento, qualificação e várias políticas públicas, possam igualitariamente estar dentro do contexto social-político-econômico e não um grupo especifico”, defende.

Daniel Pintto aponta que a população negra brasileira hoje é mais de 54% e, quando se analisa os cargos de liderança, que são significativos para que todos possam ser representados não somente pela presença física, mas principalmente por ações diretas que possam ser beneficiadas, não se vê a mesma proporcionalidade. “A outra metade da população, que não é negra, absorve parcela significativa de todos os bens, serviços e elementos diretos que vão qualificar uma vida com mais segurança”, pontua.

Autoestima

A questão da autoestima é abordada em vários aspectos no livro, que perpassa por questões do cabelo, da tonalidade da cor da pele, de elementos significativos que possam agregar e não tirar valores da beleza negra. “Existem vários termos que são racistas, várias ‘brincadeiras’ que não são brincadeiras. A partir do momento que eu sei que a população do planeta terra é de 7.8 bilhões de pessoas e que eu não tenho uma obrigatoriedade de estar dentro de um padrão preestabelecido por uma sociedade, que eu me vejo enquanto negro e que as minhas características negras são reais, de um povo, de um continente e que não precisam ser comparadas com de nenhum outro povo, eu, enquanto criança, adulto, homem ou mulher negra, não vou ter as paranoias sociais para estar dentro de outra característica estética. Eu posso me valorizar enquanto pessoa negra, com cabelo crespo, com a carga maior ou menor de melanina, uma vez que existem mais de 77 tons de peles negras, sabendo que existe uma beleza típica para quem é considerado negro. A minha autoestima começa a ser trabalhada de uma forma mais positiva sem depreciar uma em vantagem da outra”, relata o autor de Reflexões Negras.

Livro

O professor e cartunista amador, geógrafo formado (UEFS), especialista em antropologia e turismo, Daniel Pintto, lança o livro Reflexões Negras - Superando o racismo e seguindo em frente. Próximo a chegar na idade dos “enta”, nono de dez irmãos naturais de Feira de Santana e conhecedor de 23 das 27 capitais do Brasil, além de 22 capitais e centenas de cidade do interior de países estrangeiros dos pelo menos 50 que deseja conhecer, o autor ressalta a importância de “escrever sobre a presença e a representatividade direta do negro superando o racismo, porque uma pessoa que sofre um ato desses não vai esquecer”.

Esta primeira obra, prefaciada pela professora Elizabeth Motta, doutoranda em Linguagem pela Ufba, e com capa ilustrada por fotografia clicada pelo jornalista e fotógrafo Paulo Norberto, será lançada oficialmente no dia 01 de dezembro, às 19h no Centro Universitário de Cultura e Arte (CUCA), contando com peça teatral de Geovane Mascarenhas.


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