Na última quinta-feira vi na Globonews a entrevista do advogado de Bolsonaro. Chama-se Paulo Cunha Bueno. Bem articulado, firme nas suas colocações, professor, enfim, tem ótimas credenciais como profissional na área jurídica e reconhecimento por seus pares.
No entanto, não comungo com as teses de sua defesa no caso de Bolsonaro. Sou advogado e também professor, portanto, sinto à vontade e com experiência suficiente para, com toda lhaneza, discordar solenemente com os argumentos que pretende utilizar para salvar da prisão o intragável ex-presidente.
Existe uma máxima no direito se falta argumentos consistentes para se opor aos fatos que torna quase impossível ter ganho de causa num processo, busca-se, então, tentar encontrar algum ponto no ordenamento processual para obter uma decisão favorável, no caso de Bolsonaro impedir a sua prisão.
O advogado do inominado ex-presidente da república parte da premissa de que ele nada sabia das tramoias de golpe tentadas pelos militares. No relatório da Polícia Federal, esse argumento de que nada sabia, diria até que é um delírio. Diz ele, o advogado, quem seria beneficiado com o golpe de estado? Não há uma só linha no relatório do inquérito que uma vez dado o golpe de estado, haveria uma junta militar que tomaria o poder, como tenta argumentar o Cunha Bueno.
Existem inúmeras situações e arregimentadas no inquérito da PF que não só Bolsonaro sabia, como articulou e como se daria o golpe. Não foi adiante porque o Comandante do Exército se negou a participar daquela patifaria, e ainda disse que se o presidente da república tentasse ele o prenderia.
O advogado de Bolsonaro sabe lá no intimo dele, que o relatório é revelador e fartamente provado que o infeliz não só articulou como incentivou todos os atos golpistas ou sua tentativa.
É sabido que o papel do advogado de defesa é de tentar inverter tudo aquilo que vai de encontro ao seu cliente. Buscar elementos concretos e assim livrar da cadeia seu constituinte. O que não pode, e aí vai uma crítica construtiva, é atentar contra a inteligência dos outros. Isso tira a credibilidade de um trabalho de defesa jurídica e do próprio profissional.
Defender a ideia de que Bolsonaro nada sabia e que foi traído pelos militares e que não se beneficiaria com o golpe, é demais. Esse argumento não convence nem as emas do Palácio da Alvorada. É tão ruim que nem errado é.
Como disse no início deste texto, na falta de argumentos contrafactuais, resta centrar os canhões no ordenamento processual. Buscar uma falha ou uma inconsistência no processo.
O advogado de Bolsonaro defende que o processo deveria ir para o juiz do primeiro grau e não ser julgado pelo STF. Não cola. E ele sabe que já está pacificado pela jurisprudência do tribunal que crimes cometidos pelo presidente da república no exercício da atividade pública é de competência do Supremo, mesmo quando afastado do cargo. A corte não vai mudar de posição. Ele sabe disso. Mas para passar a imagem de que o infeliz está sendo perseguido é a ideia a ser defendida. Não vai colar.
O outro argumento é o de suspeição do Alexandre de Moraes. Cabe aqui definir o que é suspeição e impedimento de um juiz. Primeiramente, impedimento é uma situação objetiva, por exemplo, o juiz ter atuado como mandatário da parte no processo ou ainda ter prestado depoimento como testemunha. No caso de Alexandre de Moraes tal desiderato não aconteceu.
Suspeito tem caráter subjetivo, no caso o magistrado for amigo ou inimigo de uma das partes do processo. Pelo que se saiba o ministro nunca manifestou que tenha sido amigo ou inimigo de Bolsonaro. Levando esses conceitos para a seara processual penal, a suspeição não ocorre de forma alguma.
Diz o artigo 252 do Código de Processo Penal que o juiz está impedido de exercer a sua função se tiver interesse direto na causa. Foi apurado que ele estava na mira de ser morto pelos aloprados de farda. Isto não o faz ter interesse direito na causa. E sabe por que? Quem foi ameaçado foi a instituição e não ele. Sei que é um raciocínio sofisticado, mas boa parte das pessoas não têm essa compreensão. Inclusive advogados, fazer o que?
Diz ainda o Código de Processo Penal em seu artigo 256 que não existe suspeição se a parte injuriar o magistrado ou der motivo para criá-la. Se não fosse assim, bastava o acusado sair por aí injuriando a torto e a direito qualquer magistrado que estivesse à frente de seu processo para afastá-lo. Isso até o meu estagiário do meu escritório sabe disso.
Então tentar afastar o ministro Alexandre de Moraes por estes argumentos processuais, são tão rasteiros, que beiram ao ridículo. O Supremo não vai afastar Moraes do processo que envolve o golpista-mor. E não é por mera discricionariedade, mas por impedimento legal. Os argumentos de suspeição ou impedimento bem definidos tanto na legislação processual civil ou penal não autorizam os argumentos do bom advogado do golpista.
Pugno pela ampla defesa e o contraditório a ser utilizado pelo advogado de defesa do golpista. É um direito sagrado. O que não pode é depor contra a inteligência dos outros. E ao que tudo indica, restará apenas como argumento somente o tempo de prisão e só!